se•te, adj. num., s. m.
aniversário de servidor. cabala. trajetória docente. freud e os ofícios impossíveis. sofrer melhor, mais bonito.
1. que corresponde a uma unidade a mais que seis e uma a menos que oito
ontem, seis de julho, fez sete anos que iniciei minha vida no serviço público. sete é um número místico, especialmente na cabala. durante um tempo na minha vida, li um bocado sobre cabala, alquimia, essas coisas, e cheguei a fazer algumas práticas. acho interessante até hoje; qualquer coisa que promova articulação no nível simbólico me parece construtivo. de todo modo, não creio que isso diga algo sobre minha servidão pública.
em retrospecto, não posso dizer que essa trajetória foi propriamente tranquila. se você fizer as contas, assumi em julho de 2018, já na ascensão da extrema-direita à presidência. em 2019, foi um ano de trabalho angustiado e autocensurado: ninguém sabia o que poderia acontecer em termos de exoneração arbitrária ou perseguição – o que, de fato, aconteceu com colegas no brasil. 2020, bom, vocês sabem.
do retorno presencial em 2022 em diante, acho que vivemos ainda sequelas disso tudo. principalmente em termos políticos mais amplos, a estagnação é muito mais sensível do que eu gostaria que fosse. isso estourou na greve do ano passado – que é algo sobre o qual ainda preciso escrever aqui, inclusive – mas também não houve a mobilização que correspondesse ao tamanho do problema.
ano passado, escrevi um texto no instagram que acho ainda atual. reproduzo a seguir.
2. associado à sorte, perfeição ou mistério
freud dizia que há três ofícios impossíveis: educar, psicanalisar e governar.
ofício. há algo da vocação, desse chamado do mistério – e quem vê mistério no diário oficial da união? que mistério há naquela velha configuração de um microespaço, espaço que é uma hierarquia professoral? que mistério há nessa performance desbotada, desacreditada, sucateada?
impossíveis. porque são o engajamento com o real, aquilo que não cessa de não se inscrever, de fluir, de faltar. de escapar. impossível pela linguagem, que desliza, metaforiza, distorce. “comunicação não é a mera operação com códigos”. e ainda há quem finja – ou pior, acredite – “transmitir conteúdos”.
como freud, tenho visto cada vez mais semelhanças entre educação e psicanálise. ontem, me fizeram uma pergunta a que não dei uma boa resposta na hora. algo da ordem do objetivo da aula, se era fazer pensar mais criticamente nossa atividade, etc. “sim, pode ser”, respondi, “seria bom se isso acontecesse”.
depois de pensar um bocado, termino de responder agora: um bom objetivo para a educação, tal qual na psicanálise, seja abrir novas maneiras, maneiras mais bonitas, mais singulares, mais emancipadas, de sofrer.
o detalhe é que há uma pedra no meio do caminho. há um sistema ultracomplexo global de exploração e submissão dos sujeitos – entre cujas expressões está precisamente essa plataforma em que você me lê. para que cada um de nós possa aprender a sofrer mais bonito, é preciso lutar por um mundo diferente, em que as pessoas tenham condições materiais para se singularizarem.
para todos os efeitos, a servidão pública, para mim, significa apontar para a possibilidade de construirmos, aqui e agora, uma experiência humana que supere as codificações estereotipadas de alegrias e sofrimentos, de angústias e esperanças. talvez, freud dissesse que esse é um ofício duplamente impossível.